Como um professor transformou sucatas em um projeto de educação musical na Brasilândia

Garrafas, baldes, cabos de vassouras, pedaços de plástico e latas de alumínio.

Materiais que teriam como destino principal o lixo são transformados em instrumentos musicais nas mãos de quatro jovens moradores de Brasilândia, distrito que concentra morros e comunidades na zona norte de São Paulo.

Sob o comando do professor de música Rafael Rip, os meninos Danilo Dantas, Edivaldo Guedes, Kaique Silva e Matheus Souza compõem o grupo Embatucadores.

Eles constroem melodias com qualquer coisa, inclusive com o próprio corpo.

“Tudo, absolutamente tudo pode virar música. A gente já tocou com uma caneta, com uma latinha e às vezes compomos só com o nosso corpo”, explica Rip, que dá aulas de artes na escola estadual Flamínio Fávero, na capital.

Desde 2003, o professor acolhe voluntariamente turmas de 20 crianças para ensinar educação musical.

O professor defende que a iniciação musical seja direito de todas as crianças e, para isso, começou a pensar em como as sucatas poderiam auxiliar nesse processo.

“É muito importante para o desenvolvimento melódico que os jovens também escutem as notas afiadas. O trabalho de construção rítmica que a gente faz por meio das sucatas não é um trabalho convencional, é somente uma parte da música. E isso só é possível se a gente tiver acesso ao conhecimento das melodias e das notas musicais tradicionais.”

As aulas acontecem no turno oposto das atividades escolares e já chegaram a reunir 80 jovens com muita vontade de criar e batucar.

Os ensaio acontecem em uma sala cedida pela diretoria da escola que está equipada com objetos de doações.

Apresentação do grupo Embatucadores em Paraty, no Rio de Janeiro.

Dez anos após a sua primeira aula na Brasilândia, Rip fundou o projeto musical Embatucadores, que tem como principal inspiração o grupo britânico STOMP.

“O grupo que me acompanha hoje são de jovens que tinham 11 anos quando começaram a frequentar as aulas. Há seis anos, a gente decidiu montar um show para que eles se apresentassem em locais públicos da cidade”, explica.

Minhocão, Avenida Paulista, Sesc e o Theatro Municipal já serviram de palco para que os garotos produzissem a sua música.

Neste ano, o grupo passar por uma profissionalização. Em junho, tiveram uma temporada de apresentações em Portugal e vão lançar neste mês o seu primeiro disco com singles gravados.

“Quando fomos para a rua, tivemos um retorno muito positivo do público, inclusive com mais convites de apresentação e de pessoas interessadas em monetizar o nosso show. Foi com o volume de shows aumentando que nós viramos realmente um grupo. Eu deixei de ser o professor de alguns meninos para fazer parte de um grupo de músicos”, avalia Rip.

Quando alunos se tornam multiplicadores

Apesar do crescimento das apresentações, o projeto em sala de aula ainda se mantém vivo, sobretudo por conta da dedicação dos alunos mais velhos.

“Eles se tornam multiplicadores de música. E o grupo passou a ser visto com um modelo, um incentivo para quem está na sala de aula. Isso é importante, principalmente, em uma região com tantos problemas financeiros, familiares e com pouca opção de lazer ou acesso a cultura”, diz Rip.

Coordenação motora, independência do corpo, ritmo e performance. As possibilidades do trabalho com o instrumento não convencional são infinitas. Mas muito além da música, os Embatucadores avaliam que fazer parte do grupo transformou a visão que eles tinham sobre disciplina e cooperação.

“A imagem que a gente quer passar em cada show é que cada pessoa, com um pouquinho de força de vontade e um pouco de criatividade, pode fazer tudo o que quiser”, resume Matheus Souza, 19, um dos percussionistas.

Fonte: Huffpost

Compartilhar

Últimas Notícias