Nostalgia: lembra do disco? Ele voltou com força ao mercado

ichel Nath, 42 anos, faz parte de um grupo restrito de empreendedores da nova indústria fonográfica. Músico, compositor, pesquisador e DJ, ele virou empresário por uma combinação de acaso, missão e persistência. Amante dos LPs desde a infância, Nath decidiu registrar em vinil seu álbum SolarSoul, de 2013. Naquele ano, encomendou 500 cópias a uma empresa da República Tcheca.

Durante a longa espera pela entrega dos LPs, foi procurar saber o que ele e um grupo de conhecidos do cenário musical poderiam fazer para ter vinis no país com alta qualidade. Nesse processo, ficou sabendo que sete prensas da antiga gravadora Continental estavam abandonadas em um ferro-velho. “Achei que seria um tolo se não agarrasse essa oportunidade.” Ele arrematou as prensas e, assim, teve início a sua epopeia empreendedora.

Existem apenas 95 fábricas de vinil no mundo, distribuídas em 30 países, segundo levantamento do site Vinyl Pressing Plants. Instalada em um galpão de 210 m2 no bairro da Barra Funda, em São Paulo, a Vinil Brasil, que Nath fundou e comanda, é a segunda indústria do setor em atuação no Brasil — a outra é a Polysom, que funcionou de 1999 a 2007 e foi reativada em 2009. São negócios que procuram explorar e revigorar um segmento que cresce ano a ano, desde a metade da década passada.

Cultura de massa. Porção de acetato prestes a ganhar as ranhuras e os acordes de um LP, na fábrica da Vinil Brasil (Foto: Divulgação )

O disco foi a mídia dominante desde o início das músicas gravadas, em 1900, até o começo dos anos 90. Depois, caiu diante do avanço do CD e de outros formatos de áudio, como o MP3, até quase sumir do mapa. Mais conveniente, o streaming se tornou o meio mais popular, respondendo por 38% do faturamento da indústria de música.

Os bolachões, como são carinhosamente chamados os discos de vinil, atravessaram esse período de grandes transformações em estado de hibernação, reverenciados apenas por saudosistas, colecionadores e apreciadores da boa música, e produzidos por raríssimas fábricas no mundo. Aos poucos, no entanto, começou a conquistar novos fãs. Muitos jovens que nasceram na era do MP3 já cultuam o meio. Representantes de diferentes gêneros musicais também passaram a procurar esse suporte de gravação. Esses movimentos explicam o fato de as vendas de discos de vinil terem registrado aumento de 22,3%, quando a comercialização dos meios físicos em geral apresentou declínio de 5,4%. Esse crescimento garantiu ao bom e velho vinil abocanhar 3,7% do total do mercado de música gravada. Nada mau para um formato que parecia morto.

Michel Nath, DJ e fundador da Vinil Brasil: ele encontrou prensas de LPs num ferro-velho, arrematou o equipamento e abriu uma fábrica (Foto: Divulgação)

Nath crê que os formatos de áudio possam conviver bem, cada um prestando-se a um determinado fim. Ele credita o ressurgimento do interesse pelo vinil à busca por maior profundidade e tangibilidade nas relações. “Tivemos uma overdose do simulacro do mundo digital.”  Em sua opinião, assim como os livros, os discos garantem a perenidade física da música.

Foi por acreditar no papel do vinil para a preservação da cultura que ele mergulhou no projeto da Vinil Brasil. O primeiro passo foi restaurar as prensas de 1953, abandonadas havia 20 anos. Ao mesmo tempo, foi buscar conhecimento sobre equipamentos, materiais e processos.

Com as prensas recuperadas, a empresa produz 10 mil LPs e compactos por mês. A fábrica aceita encomendas de lotes de 300, 500 e mil unidades. Em média, os custos de produção começam em R$ 30 o valor unitário para discos simples e em R$ 50 para os duplos. Em pouco mais de um ano de atividade, a Vinil Brasil já prensou 118 títulos e mais de 50 mil discos.

ALTA FIDELIDADE. Um público fã de formatos antigos de áudio faz girar fábricas e lojas

Nos Estados Unidos, a venda de discos voltou a render mais que o download. No Brasil, empresários investem no crescimento (Foto: Divulgação)

Fazendo fita
Pioneira na retomada da fabricação de LPs no Brasil, em 2009, a Polysom abriu no ano passado uma linha de produção de fitas cassete, com capacidade para cerca de 10 mil unidades por mês. No catálogo estão títulos como Deus é Mulher, de Elza Soares, Usuário, do Planet Hemp, e Tranquility Base Hotel & Casino, do grupo britânico Arctic Monkeys — lançado neste formato exclusivamente no Brasil. Por R$ 49,90, as novas fitas custam mais caro que as dos anos 90. Mas os tempos são outros e o consumidor, também. Aquelas eram o meio mais barato disponível, quando mal havia streaming e armazenamento na nuvem. Os novos cassetes são objeto de culto, feitos com o refinamento técnico que isso exige.

Nos Estados Unidos, a venda de discos voltou a render mais que o download. No Brasil, empresários investem no crescimento (Foto: Divulgação)

Playback
O Brasil não voltou a fabricar toca-discos em larga escala — ao menos por enquanto. Os equipamentos à venda são importados de boa qualidade, geralmente muito caros, ou equipamentos acessíveis, a maioria com estilo retrô, importados da China. Por essa razão, o trabalho iniciado por Leila Vilhena, 39 anos, tem boa repercussão no país. A publicitária de Poços de Caldas (MG) garimpa vitrolas antigas onde quer que vá, conserta os equipamentos e os vende exclusivamente pelo perfil @Vitrolaria, no Instagram. Desde que começou essa atividade, no fim de 2016, ela vendeu cerca de 30 aparelhos. Como faz envio pelos Correios, trabalha exclusivamente com vitrolas portáteis.

Nos Estados Unidos, a venda de discos voltou a render mais que o download. No Brasil, empresários investem no crescimento (Foto: Divulgação)

De segunda mão
A repopularização das vitrolas deu novo alento às feiras de antiguidades, sebos, lojas especializadas e e-commerces especializados em LPs. Depois de passar 15 anos comprando discos de vinil, o engenheiro de minas Manoel Jorge Dias, de 63 anos, abriu o Casarão do Vinil em 2014, no bairro da Mooca, em São Paulo. Empreiteiro responsável por demolições como a da penitenciária do Carandiru, Dias tem uma discoteca com cerca de 1 milhão de discos. Aos sábados, sua loja promove dois feirões, nas ruas do Oratório e da Mooca, com discos a R$ 1,99 e R$ 4,99. O negócio fatura R$ 70 mil por mês, valor que o empresário almeja aumentar em 50% com a inauguração de um novo endereço, também na Mooca.

Fonte: PEGN

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