Todo o petróleo de Urucu, em Coari, está sendo refinado em São Paulo, enquanto a refinaria de Manaus não refina nenhum litro do nosso petróleo.
A informação veio à tona nesta quarta-feira (20), pelo ex-deputado Marcelo Ramos, com base em um relatório robusto do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (INEEP) publicado em maio de 2025.
O documento expõe os efeitos negativos da privatização da Refinaria de Manaus (Ream) e alerta para um problema logístico que pode afetar diretamente a produção de petróleo no Amazonas.
Até 2022, a antiga Reman, refinava todo o petróleo extraído em Urucu. Eram transportados cerca de 50 mil metros cúbicos a cada 35 a 40 dias, garantindo uma produção média de 40 mil barris por dia.
Em 2024, a redução foi ainda mais drástica: apenas 10 mil barris/dia. E, em 2025, a situação se agravou. A Ream solicitou petróleo de Urucu apenas em fevereiro e, depois disso, não fez nenhum outro pedido — o que significa que a refinaria de Manaus não processa um único litro do petróleo extraído no estado.
“Sem o processamento em Manaus, o petróleo de Urucu precisa ser transportado por balsas, em uma viagem de 14 a 16 dias, até o terminal de São Sebastião, em São Paulo, para então ser refinado. Enquanto isso a nossa refinaria do Amazonas refina zero petróleo e nós continuamos pagando a gasolina mais cara do brasil.” destaca o ex-deputado.
O relatório do INEEP reforça que a venda da refinaria para o Grupo Atem, concluída em 2022, não trouxe concorrência nem reduziu preços.
Pelo contrário: criou um monopólio privado e aumentou a dependência da região de combustíveis importados, com impactos negativos sobre consumidores, empregos e arrecadação de impostos.
Concorrência prometida, monopólio consolidado
Com a privatização no final de 2022 – vendida por 70% do seu valor , segundo INEEP – esse cenário mudou radicalmente. Em 2023, a produção caiu para menos de 30 mil barris/dia pela primeira vez na história.
Segundo o INEEP, o governo Bolsonaro privatizou a refinaria prometendo investimentos, eficiência e redução dos preços dos combustíveis. No entanto, os dados mostram o oposto.
Antes da privatização, o Grupo Atem já tinha 52,3% do mercado de combustíveis do Amazonas. Após adquirir a REAM, passou a controlar a refinaria, o terminal aquaviário de Manaus e parte estratégica da logística regional, concentrando ainda mais o mercado.
“Houve substituição de um monopólio estatal por uma verticalização privada sem ganhos de eficiência ou redução de preços”, aponta o relatório.
Paralisação do refino e importações em alta
O relatório revela que, entre junho de 2024 e fevereiro de 2025, a refinaria praticamente parou de refinar petróleo. Embora a empresa alegue parada programada de manutenção, denúncias do Sindipetro-AM e da Federação Única dos Petroleiros apontam que a unidade passou a atuar apenas como terminal logístico para importação e distribuição.
Os dados reforçam essa mudança:
- O volume processado caiu 69,3%, de 30.989 barris/dia (2022) para 9.469 barris/dia (2024).
- A participação do petróleo importado saltou de 0% (2022) para 19,7% (2024).
- As importações via Porto de Manaus dispararam 143,9% no mesmo período.
Enquanto isso, as receitas da REAM triplicaram e o lucro líquido cresceu 247%, impulsionados pela revenda de combustíveis importados, e não pela atividade de refino.
Preços dos combustíveis entre os mais altos do país
O relatório aponta que os consumidores foram os mais prejudicados. Desde a privatização, os preços médios de gasolina, diesel e gás de cozinha no Amazonas figuram entre os mais altos do Brasil:
- Gasolina: preços 10% acima da média nacional em 19 dos 28 meses analisados.
- Diesel S10: diferença superior a 3% na maior parte do período.
- Gás de cozinha (GLP): botijão de 13 kg custa até R$ 20 a mais no Amazonas em relação à média nacional.
O INEEP afirma que, enquanto a Petrobras manteve políticas de estabilização de preços, a REAM praticou valores acima do Preço de Paridade de Importação (PPI) e da própria Petrobras, sobretudo após a paralisação do refino.
Empregos e arrecadação em queda
A privatização também trouxe impactos sociais e fiscais relevantes, de acordo com o documento.
A média salarial na refinaria caiu de R$ 23,2 mil em 2022 para R$ 9,5 mil em 2024, acompanhada por um aumento da terceirização e pela redução de benefícios para os trabalhadores.
No campo fiscal, a participação do setor de refino na arrecadação de ICMS despencou de 14,7% em 2019 para apenas 4,7% em 2023.
Além disso, a eventual isenção fiscal aprovada em 2025 pode representar uma perda estimada de até R$ 3,6 bilhões por ano para os cofres estadual e federal.
INEEP pede revisão profunda
Diante desse cenário, o INEEP faz uma série de recomendações:
- Denúncia ao Cade por práticas anticoncorrenciais.
- Fiscalização rigorosa da ANP sobre a capacidade de refino da REAM.
- Revogação da autorização de refino, caso os índices continuem abaixo dos padrões nacionais.
- Retirada da isenção fiscal para a atividade de refino na Zona Franca de Manaus.
- Revisão da política de abastecimento para reduzir a dependência de derivados importados.
“Os resultados da privatização mostram que a REAM opera hoje mais como um terminal de importação do que como refinaria. Isso compromete a segurança energética e não justifica benefícios fiscais bilionários”, alerta o relatório.
Foto: Reprodução/Site Ream
Fonte: Real Time 1.