Tragédia leva estudante a criar tecnologia para despoluir rios

Raízes das plantas são as responsáveis por fazer o trabalho de retirada dos resíduos poluentes

William Pessôa, fundador da LiaMarinha | Facebook/Reprodução

 

Não tem como passar incólume. Com a maior tragédia ambiental do Brasil ocorrendo literalmente em seu quintal — a família tinha uma roça na área destruída pelo rompimento da Barragem do Fundão e o pai dele, que nada sofreu, era funcionário da mineradora Samarco —, William Pessôa, então estudante de Engenharia, tomou a decisão. “Era o momento de parar de pensar só no problema e descobrir soluções.”
Depois de formado pela Universidade Federal de São João Del Rey, o marianense conseguiu um estágio em Zagreb, na Croácia, em 2016. “Lá eu trabalhei com tecnologias que partem de processos naturais para descontaminar rios, reservatórios de água em geral e efluentes”, explica. Na volta, em 2017, nascia a LiaMarinha, startup que, nos anos seguintes, receberia um aporte de R$ 400 mil da Fundação Renova por meio de um programa inicial de aceleração de tecnologias montado pelo Senai.
“A tragédia mudou a vida de todo mundo em Mariana. Sou nascido e criado na cidade. Minha família, tio e primo vêm da mineração. Por que não aplicar aquela tecnologia a que tive acesso na minha região?”, indaga Pessôa. O plano, então, saiu do papel, passou pelos laboratórios da Universidade Federal Viçosa e chegou ao mundo real, mesmo que em forma de um projeto piloto. “A tecnologia foi instalada no Rio Gualaxo do Norte, na bacia do Rio Doce, por um ano. Nós conseguimos diminuir a turbidez da água entre 20% e 40%”, afirma o diretor da LiaMarinha.
Quem olhar da beira do rio vai enxergar uma espécie de jardim suspenso na margem. As raízes das plantas quase sempre nativas são as responsáveis por fazer o trabalho. A ideia é que os sedimentos dispersos grudem nas plantas ou então precipitem no fundo, parando de circular na água. “Essa é uma parte do sistema. A outra envolve a instalação de barreiras filtrantes perpendiculares ao rio, também feitas com fibras orgânicas”, explica o engenheiro. Segundo Pessôa, o trunfo do sistema, além de ser de baixo custo, é que ele usa apenas matérias-primas naturais e não precisa de nenhum tipo de energia para operar.
“Depois da validação da tecnologia no Vale do Rio Doce, nós descobrimos que o sistema também tem aptidão para ser usado de outras maneiras. Como, por exemplo, no tratamento dos efluentes da indústria da mineração”, explica o criador da LiaMarinha.
Por meio de resíduos disponíveis em cada região, como esterco de porcos e aves, casca de arroz ou bagaço da cana, são criadas condições para que microrganismos se desenvolvam nas piscinas de água de rejeito que existem perto das minas. Conclusão: muitos dos contaminantes que podem virar dor de cabeça para o setor acabam sendo eliminados por meio da biorremediação que ocorre no local. “No caso dos testes com a CSN, em Santa Catarina, reduziu-se, em média, em 95% o alumínio, em 80% o ferro, em 65% os sulfatos e em 80% os compostos sólidos”, afirma Pessôa.
O resultado final é que os metais pesados presentes na água de rejeito da mineração são transformados pelo microrganismos e a água deixa de ser tóxica. “Também usamos os conceitos da economia circular ao fazer com que resíduos sejam usados no processo”, diz Pessôa. Menos toxicidade, em caso de acidentes, será importante para proteger as populações do entorno das minas.
Fonte: O DIA

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