Enquanto os CEOs estão falando muito sobre inteligência artificial generativa e como ela é uma tecnologia transformadora, seus funcionários têm medo de admitir que estão usando IA no trabalho.
Pouco mais da metade dos profissionais que usam inteligência artificial (52%) dizem que estão relutantes em mostrar que usam a tecnologia em tarefas importantes. E aproximadamente o mesmo número tem medo que isso os faça parecer substituíveis, de acordo com o último relatório de tendências de trabalho da Microsoft com o LinkedIn.
Cerca de 75% dos profissionais afirmaram que estão utilizando IA no trabalho – acima dos 46% há seis meses. E mais de três quartos usam suas próprias ferramentas, em vez de trabalhar com aquelas fornecidas pela empresa, um fenômeno que a Microsoft chama de “BYOAI” (“Bring Your Own Artificial Intelligence”), o que significa “trazer sua própria inteligência artificial”.
O relatório anual, divulgado na última semana, baseia-se em uma pesquisa com 31 mil profissionais, além de dados de trabalho e contratação do LinkedIn e dados de uso que a Microsoft armazena de clientes que usam seu software.
Embora a pesquisa tenha sido encomendada pela Microsoft – que vende a ferramenta de IA Copilot e tem uma grande participação na empresa de inteligência artificial OpenAI – ela oferece um retrato de como os trabalhadores e as empresas estão usando e encarando a IA generativa, à medida que a tecnologia deixa de ser uma novidade para se tornar uma ferramenta que está rapidamente transformando o mundo do trabalho. “O relatório mostra que os funcionários querem usar IA no trabalho e não estão esperando que as empresas os alcancem”, afirma Colette Stallbaumer, que lidera as equipes de futuro do trabalho e do Microsoft 365. “Muito disso é uso não autorizado.”
Usando IA escondidos
As descobertas do estudo abordam um fenômeno que tem preocupado executivos e pesquisadores. Em algumas empresas, os funcionários podem ter receio de compartilhar que usam o ChatGPT ou outro chatbot de IA porque existe uma política que proíbe o seu uso.
Mas em muitos outros casos, trata-se mais de uma mentalidade dos funcionários, que acreditam que se seu chefe descobrir que ele está usando inteligência artificial, isso vai prejudicar sua imagem. Essa preocupação é relevante, especialmente em um momento em que muitos estão apreensivos com a segurança no emprego em meio a mudanças econômicas e uma aparente ameaça da IA.
Ethan Mollick, professor da Wharton School da Universidade da Pensilvânia e estudioso da inteligência artificial, chama esse movimento de “shadow IT” (“TI paralela” ou sombra da TI, em tradução literal) – a prática de usar softwares, aplicativos, dispositivos ou serviços de tecnologia sem a aprovação ou conhecimento da empresa ou do departamento de TI. “Todo mundo está tentando não mostrar que automatizou seu trabalho.”
Em seu livro publicado recentemente, “Co-Intelligence”, Mollick escreve que pesquisas mostram que as pessoas julgam o trabalho de maneira diferente quando sabem que o conteúdo foi produzido com ajuda da IA. Como resultado, “muito do valor do uso da IA vem de pessoas que não sabem que você a está usando”, ele escreve.
O pesquisador menciona uma pesquisa não científica conduzida por ele nas redes sociais, na qual os usuários de inteligência artificial disseram que não revelam que estão usando essa tecnologia. “Se alguém descobrir como automatizar 90% de um determinado trabalho e contar ao seu chefe, a empresa demitirá 90% dos seus colegas de trabalho? Melhor não falar.”
Assim, as empresas que querem aproveitar a eficiência da IA devem destacar os trabalhadores que a utilizam como forma de garantir que ela é valorizada no ambiente de trabalho. Também podem treinar os profissionais com essa habilidade para reforçar que é algo bem-vindo. O relatório da Microsoft mostra que apenas 39% das pessoas que usam IA afirmam ter recebido treinamento da sua empresa. “As companhias precisam ter uma estratégia para a IA”, diz Aneesh Raman, vice-presidente e especialista em força de trabalho do LinkedIn. “Isso é gestão de mudança em um nível totalmente novo.”
Habilidades em IA
Este ano marca a primeira vez que a Microsoft trabalhou no relatório com o LinkedIn, que adquiriu em 2016. A big tech encontrou um papel cada vez mais importante para a IA na plataforma, tanto nos cargos como no que os candidatos e gestores esperam.
Segundo o estudo, a posição de “head de IA” triplicou nos últimos cinco anos e cresceu mais de 28% no ano passado. Além disso, o LinkedIn registrou um aumento de 142 vezes de usuários adicionando habilidades de IA aos seus perfis, enquanto as inscrições em vagas que mencionam IA tiveram crescimento de 17% nos últimos dois anos em comparação com as que não mencionam essas habilidades.
Por “habilidades de IA”, nem o LinkedIn – nem as pessoas que estão adicionando isso aos seus perfis – estão necessariamente se referindo a competências técnicas de aprendizado de máquina. “Estamos tão no início que tudo está sendo chamado de habilidades de IA”, diz Raman, do LinkedIn. “Comece a brincar com isso e você vai perceber que não se trata de um conjunto de habilidades altamente técnicas.”
Veja áreas, empregos e profissões que devem sobreviver à inteligência artificial:
1. Profissões que exijam criatividade
Empregos que demandam criatividade genuína. Não pensem em fotógrafos e designers pois a IA já vem dominando a estética e produzindo imagens satisfatórias para diversos fins. “Áreas que exigem uma visão criativa ou artística bastante apurada, como criar conceitos de campanhas de marketing, por exemplo”, diz Fernando Pedro, diretor-geral da Assigna, empresa do Talenses Group, voltado ao recrutamento de profissionais.
2. Educação e desenvolvimento de pessoas
Funções que exigem habilidades sociais complexas, como cargos voltados para o desenvolvimento de pessoas, estão entre as que não devem ser substituídas tão cedo. “Educadores e professores não têm como ser substituídos com o que conhecemos hoje”, diz Jordano Rischter, sócio da Wide.
3. Gestão de crises e negociações
Gerenciamento de conflitos e de crises, além de negociações complexas, dependem da capacidade humana de análise, algo que a Inteligência Artificial ainda não atingiu. Gestão de crise é também um assunto complexo que exige a coordenação de uma série de atores envolvidos no processo, bem como a análise rápida para importantes tomadas de decisão.
4. Advogados, profissionais que lidam com questões morais e éticas
A área jurídica pode mudar com a automatização de tarefas. Hoje, há maneiras de usar a IA para produzir petições, por exemplo. Mas as áreas que exigem análise de um caso, por exemplo, e criação de estratégias, dependem do pensamento e experiência humana.
5. Profissionais de gestão estratégica
A Inteligência Artificial não tem como substituir o trabalho de quem pensa os caminhos de gestão das empresas, toma decisões rápidas e estratégicas. “De qualquer forma, em alguma parte do processo a IA pode contribuir, seja acelerando uma pesquisa, buscando outras fontes, ou realizando análises preditivas”, diz Fernando Pedro.
6. Relações interpessoais complexas e cuidadores
Enfermeiros, psicólogos, médicos, jornalistas investigativos e outros empregos que exigem um conhecimento profundo das pessoas: a IA está muito longe de conseguir construir relacionamentos.
7. Trabalhadores manuais
Empregos que exigem destreza e capacidade de resolução de problemas, como eletricistas e encanadores, não são fáceis de automatizar. Eles exigem que os profissionais lidem com questões que não são previsíveis e encontrem soluções únicas, o que a IA ainda não pode realizar.
Fonte: Forbes.