Em um país com recordes de homicídios de pessoas trans, ter acesso à educação muitas vezes pode parecer uma realidade distante. É para contribuir com a construção de novas possibilidades de futuro que nasceu o “Cozinha & Voz”, projeto do Programa de Ações Inclusivas do SENAI (PSAI).
O nome “Cozinha & Voz” é dividido em duas frentes: o curso na área da Alimentos e Bebidas e o foco em comunicação e expressão. E o motivo? Um dos maiores desafios das pessoas trans é a comunicação e autoestima. Por isso, trabalhar conceitos de oratória e confiança são essenciais na vida das alunas e alunos.
O dado da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) mostra que apenas 4% da população trans estão em empregos formais. É por isso que o PSAI atua não apenas na aprendizagem das pessoas desse grupo, mas também na inserção dentro do ambiente profissional, no pós-contratação e na permanência dessas pessoas nos empregos.
O “Cozinha & Voz” é um projeto para promover oportunidades e acesso para todos, com liberdade, equidade, segurança e dignidade. Uma ação desenvolvida pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), pelo Ministério Público do Trabalho (MPT e pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), com parceria da Casa Poema e da chefe de cozinha Paola Carosella.
Até o momento, 108 pessoas trans e travestis foram formadas e capacitadas pelo “Cozinha e Voz”.
“O projeto é uma iniciativa do PRIDE – Promovendo Direitos, Diversidade e Igualdade no mundo do trabalho, projeto iniciado na OIT que, por meio do desenvolvimento de capacidades profissionais e de habilidades socioemocionais, promove o trabalho decente e a inclusão”, explica a Gestora do Programa SENAI de Ações Inclusivas, Suzana Figueiredo.
Depois do projeto, as pessoas formadas são acompanhadas pelo Instituto + Diversidade e pela Rede Cidadã, que facilitam a formação continuada e orientada ao mercado de trabalho e a busca ativa de potenciais empregadores.
Camila Almeida, coordenadora de projetos da OIT e do projeto PRIDE, explica que o programa é orientado a impulsionar a inclusão de pessoas LGBTQIA+ em situação de vulnerabilidade social no mundo do trabalho. A ação que se originou em 2017 está dividido em duas partes:
“O componente ‘Cozinha’ é uma forma de oferecer qualificação profissional em uma área onde há demanda de mercado e com possibilidades de acesso com requisitos básicos. Já o componente voz é uma abordagem para trabalhar autoestima e combater os efeitos da discriminação que atravessam esses grupos historicamente excluídos”, explica Camila.
Um cenário difícil, mas que pode ser mudado!
Falar de diversidade e inclusão na comunidade trans é encarar uma difícil realidade: o Brasil continua sendo o país que mais mata pessoas transexuais no mundo pelo décimo quarto ano consecutivo*. Além dos altos índices de violência, as pessoas trans ainda lidam com exclusão socioeconômica, falta de acesso à escolaridade e discriminação social.
Victor Almeida, 24 anos, foi um dos alunos que participaram do programa. Mesmo não atuando no setor de alimentos atualmente, explica que o curso abriu portas para conhecimento e novas amizades.
“O programa melhorou minha vida em 100%. Tudo que aprendi nas aulas de cozinha e poesia consigo colocar em prática na minha vida profissional e pessoal”, afirma Victor.
O jovem relembra também que, por morar numa comunidade pequena do Rio de Janeiro, a Vila do João, não conhecia outras pessoas trans. Estar sempre no meio de pessoas cisgênero era algo que o incomodava.
“O programa me deu a oportunidade de conhecer outros alunes e ter o primeiro contato próximo com pessoas trans. Estava dentro de um ambiente de acolhimento, em uma das melhores instituições, que é o SENAI”, conta.